Resumo do Módulo 4
TEXTO-CHAVE: Mt 24:37
FOCO DO ESTUDO: Gn 6–10; 2Pe 2:5-9
ESBOÇO
Introdução: Muitos questionam a historicidade do relato bíblico sobre o dilúvio, argumentando que tal evento mundial é incompatível com as visões científicas modernas da história natural. No entanto, há um registro de uma inundação colossal nas memórias culturais coletivas de muitos povos distantes uns dos outros, em todo o mundo, e não apenas no antigo Oriente Próximo, Mesopotâmia, Egito e Grécia. Narrativas do dilúvio são encontradas na Índia, China, entre os antigos habitantes da Irlanda, entre os povos maias na Mesoamérica, nativos americanos, povos antigos da América do Sul e da África e até mesmo entre tribos aborígenes da Austrália. O fato de a ciência moderna não conseguir dar sentido ao fenômeno do dilúvio não é uma prova de que esse evento nunca tenha acontecido. O fracasso da ciência moderna em explicar o dilúvio é simplesmente outra evidência dos limites da ciência, especialmente quando se trata de um fenômeno tão sobrenatural como o dilúvio de Gênesis.
Nesta semana, não estudaremos a história bíblica desse evento cósmico para entendê-lo de um ponto de vista científico. Não dispomos de todos os dados para compreender esse fenômeno. À parte da discussão científica, uma série de questões serão debatidas. A questão fundamental diz respeito ao próprio Deus: o que essa história nos ensina sobre o Deus da Bíblia e Seu propósito? O filósofo gnóstico Marcião de Sinope (85 d.C.-160 d.C.) e muitos outros cristãos depois dele usaram o dilúvio para demonstrar que o Deus do AT era um Deus violento e cruel, ao contrário de Jesus, o Deus de amor. Em nosso estudo, veremos que os atos de justiça de Deus também são demonstrações de amor e misericórdia.
COMENTÁRIO
Deus de justiça
Deus de justiça Depois da criação perfeita, ocorreu a queda, e o pecado entrou no mundo. A desobediência que começou com nossos primeiros pais aumentou até que o mundo se encheu de corrupção e maldade. Desde a época de Caim e Abel, a humanidade se dividiu em dois campos. É interessante que cada linhagem genealógica seja definida com base em seu relacionamento com Deus. Enquanto a genealogia de Caim (Gn 4:17-22) é introduzida por sua rejeição a Deus (Gn 4:16), a genealogia de Sete (Gn 5:1-32) é introduzida pela semelhança de Deus (Gn 5:1). Esse contraste explica por que a linhagem de Caim é mais tarde identificada como os filhos dos homens, enquanto a linhagem de Sete é identificada como “os filhos de Deus” (Gn 6:1, 2). Não é de admirar que o Senhor tenha Se preocupado ao observar que as duas linhagens estavam se misturando, produzindo uma nova linhagem genealógica em rebelião aberta contra Deus. A frase “tomaram para si” (Gn 6:2) sugere a intenção dos “filhos de Deus” de substituir e contrariar a atuação divina no casamento, conforme ilustrado pelas palavras “o Senhor Deus formou” a mulher e a levou para Adão (Gn 2:22). Os “filhos de Deus” queriam tomar o lugar de Deus, atitude que se reflete na frase “viram que […] eram bonitas” (Gn 6:2). Em hebraico, a palavra traduzida como “bonitas” é a mesma palavra tov, “bom”, usada para descrever a reação divina à criação: “viu que isso era bom” (Gn 1:4, 10, 12, 18, 21, 25). Essa substituição de Deus levou os “filhos de Deus” a cometer atos que não mais estavam de acordo com as leis divinas na criação, mas em harmonia com seus próprios desejos pecaminosos.
observar que as duas linhagens estavam se misturando, produzindo uma nova linhagem genealógica em rebelião aberta contra Deus. A frase “tomaram para si” (Gn 6:2) sugere a intenção dos “filhos de Deus” de substituir e contrariar a atuação divina no casamento, conforme ilustrado pelas palavras “o Senhor Deus formou” a mulher e a levou para Adão (Gn 2:22). Os “filhos de Deus” queriam tomar o lugar de Deus, atitude que se reflete na frase “viram que […] eram bonitas” (Gn 6:2). Em hebraico, a palavra traduzida como “bonitas” é a mesma palavra tov, “bom”, usada para descrever a reação divina à criação: “viu que isso era bom” (Gn 1:4, 10, 12, 18, 21, 25). Essa substituição de Deus levou os “filhos de Deus” a cometer atos que não mais estavam de acordo com as leis divinas na criação, mas em harmonia com seus próprios desejos pecaminosos.
Aliás, o uso do plural “mulheres” sugere a introdução da poligamia, e a frase “aquelas que, entre todas, mais lhes agradaram” sugere atividades sexuais selvagens e descontroladas fora da lei divina. A frase “tomaram para si mulheres […] que […] mais lhes agradaram” (Gn 6:2) tem até a conotação de satisfação própria, violência e estupro (ver Gn 39:14, 17). Todos esses atos sexuais não eram apenas uma rejeição a Deus, mas também abuso de mulheres.
O texto bíblico relata que Deus viu a maldade (Gn 6:5). Essa é a segunda vez que as Escrituras apresentam Deus como Aquele que “vê” (compare com Gn 6:1-4). Paralelamente ao relato da criação, o ato divino de ver segue imediatamente a palavra divina: “O Senhor disse […]” (Gn 6:3). “O Senhor viu que a maldade das pessoas havia se multiplicado” (Gn 6:5). Esse verso é um segundo eco ao refrão da criação, “E Deus viu que isso era bom” (Gn 1:10). Mas nesse caso o “bom” original (tob) da criação de Deus foi substituído pelo que lhe é contrário: a maldade (ra’ah). O comentário divino seguinte foi uma avaliação trágica da situação. O aumento da maldade não se referia apenas a algumas ações específicas ou atos malignos ocasionais; descrevia uma condição completa e definitiva e dizia respeito à raiz, às motivações profundas do coração humano onde Deus encontrou o mal arraigado. A humanidade havia atingido o ponto sem volta. Deus devia intervir com um dilúvio mundial para preservar um remanescente da raça humana da degradação moral completa e, portanto, da extinção.
O Deus de amor
Nessa intervenção divina, a linguagem evoca a criação. Deus lamentou ter criado o ser humano. O “arrependimento” divino está associado à tristeza divina. Deus “ficou triste […] e isso Lhe pesou no coração” (Gn 6:6). O verbo hebraico ‘atsab (“entristecer”) é o oposto de alegria (Ne 8:10) e se refere à dor mental (Gn 3:16). A emoção divina tem a ver com Seu amor pelos humanos. É significativo que o verbo hebraico nakham, traduzido como “ficou triste” (Gn 6:6), contenha a nuance positiva de “graça” e “amor”. Portanto, essa tradução para a palavra hebraica nakham não explica totalmente os sentimentos de Deus. O fato de o Senhor ter ficado triste ou Se arrependido (Gn 6:6, ARA, ARC e NVI) não significa que o Criador tivesse mudado de ideia; em vez disso, contém elementos de graça e “conforto”. Assim, a palavra nakham aparece às vezes em paralelo com a palavra shub, “mudar de ideia” (Jr 4:28; Jn 3:9).
O uso da palavra nakham trouxe esperança ao cenário – a perspectiva de salvação por meio do dilúvio. A emoção de Deus revelou Seu amor pelos humanos. No entanto, Ele expressou Seu amor por meio do juízo. A resposta divina à maldade por meio da destruição é um ato de amor. A palavra hebraica makhah, “destruir”, é apresentada em um jogo de palavras com a palavra anterior nakham (“tristeza”, “conforto”), que evoca a tristeza e a compaixão divinas para com a humanidade por meio de Noé. Enquanto nakham sugere a face positiva do juízo, makhah revela sua face negativa. Além disso, a palavra makhah pertence à linguagem do juízo. Significa, mais precisamente, “apagar”. Esse “apagamento” representa uma destruição física que opera na reversão da criação, desfazendo os atos criativos de Deus. Mas, além da destruição física, esse ato de julgamento também se refere a ser espiritualmente apagado do livro da vida (Êx 32:32, 33; Sl 69:28, 29). No pensamento bíblico, amor e justiça estão juntos (Mq 6:8).
Deus de sabedoria
A combinação de amor e justiça é precisamente o que torna a sabedoria de Deus o que ela é. O Senhor não salva apenas por meio de Sua boa vontade e amor. Os detalhes da construção da arca (Gn 6:14-22), que permitiriam a sobrevivência de todos os que nela entrassem, eram evidências tangíveis da séria atenção de Deus à realidade da vida. Esses detalhes arquitetônicos minuciosos não apenas testemunharam a realidade histórica da construção da arca; eles revelaram a preocupação divina com o sucesso da operação. Deus deu instruções precisas para esse propósito. A madeira resinosa da árvore, usada para construir a estrutura da arca, e sua seiva foram projetadas para tornar a arca impermeável por dentro e por fora. Uma janela deveria estar no topo da arca para proporcionar uma passagem de luz e ar, situada a um côvado da borda do telhado. Provavelmente era algum tipo de treliça construída ao longo da linha do telhado, trazendo luz de tal forma que os diferentes aposentos dentro da arca eram iluminados e ventilados.
O Deus que cuidou da construção da arca é o mesmo que mais tarde deu instruções detalhadas para a vida religiosa e salvação espiritual por meio dos sacrifícios do serviço do santuário. Na verdade, existem muitos paralelos entre as plantas apresentadas para a arca e o tabernáculo. As dimensões da arca (Gn 6:15) foram dadas de acordo com o mesmo padrão e com as mesmas palavras usadas para a construção da arca no tabernáculo (Êx 25:10).
Qual era o tamanho da arca? Se o côvado fosse igual a 18 polegadas ou 45 centímetros, 300 côvados para o comprimento da arca seriam 450 pés ou mais de 137 metros; 50 côvados para sua largura equivaleriam a 75 pés, ou 22 metros; e 30 côvados de altura teriam igualado a 45 pés, ou 13 metros. Essas medidas não têm significado especial, simbólico ou espiritual; elas simplesmente sugerem a magnitude do tamanho da embarcação, que era grande o suficiente para acomodar os animais e humanos a bordo. Mas os muitos paralelos entre a arca e o tabernáculo têm um significado profundo: O Deus que salva espiritualmente, Jesus Cristo, é o mesmo Deus Criador que nos salva física e materialmente.
Pergunta para discussão e reflexão: Como as três dimensões divinas – justiça, amor e sabedoria – se relacionam entre si teologicamente?
APLICAÇÃO PARA A VIDA
Não matarás. A lição essencial do dilúvio é a afirmação da vida. Após a destruição de Sua criação e a morte de todos os humanos fora da arca, Deus disse sim à vida. Nesse contexto, Ele ordenou aos humanos não apenas que se multiplicassem, mas também que não tirassem a vida, pois a vida é sagrada. Esse princípio se aplica primeiro aos animais. Portanto, a tolerância divina para algum consumo de carne, considerando a situação pós-diluviana, caracterizou-se pelo mandamento de não comer carne com sangue, pois o sangue representa a vida (Gn 9:4). Mas, no caso dos seres humanos, a aplicação divina é absoluta. Visto que Deus criou os humanos à Sua imagem, seu sangue não deve ser derramado (Gn 9:5, 6). Embora a vida dos animais seja sagrada, conforme indicado na proscrição do sangue, é significativo que apenas a vida humana exija uma prestação de contas perante Deus (Gn 9:5).
A língua hebraica possui vários verbos para se referir ao ato de matar. Todos se aplicam a humanos e a animais, exceto um, o verbo ratsakh, que se aplica apenas a humanos. É interessante o fato de ser o verbo ratsakh, “matar”, “assassinar”, o verbo usado nos Dez Mandamentos (Êx 20:13). A nuance desse uso não diferencia entre o caso de assassinato e outros casos, mas entre o objeto que é morto – humanos e animais. Portanto, o sexto mandamento não deve ser traduzido como “não matarás”, implicando apenas o caso específico de um ato criminoso, mas “não matarás seres humanos” em sentido absoluto.
Pergunta para reflexão: Como você aplica esse princípio à situação do serviço militar ou à questão da pena de morte?
